Condomínios X moradores – como o STJ tem resolvido esses conflitos

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O morador que nunca teve problemas com um vizinho, síndico ou condomínio residencial é uma raridade. As encrencas são muitas: barulho, uso de áreas comuns, uso incorreto do dinheiro do condomínio, bichos, garagem, festas… Muitas vezes, os problemas são resolvidos extrajudicialmente: numa boa conversa, num bate-boca acalorado nas reuniões de condomínio ou com uma multa. Mas há litígios que só o Poder Judiciário é capaz de sanar. De acordo com o Sindicato dos Condôminos Residenciais e Comerciais do Distrito Federal, 95% dos casos vão parar nos juizados especiais, pois geralmente são pequenos conflitos que envolvem baixos valores. As ações que vão para a justiça comum costumam envolver questões mais complexas e altos valores de indenizações. Algumas delas ultrapassam as instâncias ordinárias da Justiça e chegam aos tribunais superiores. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem julgando vários processos envolvendo condomínios residenciais, síndicos e moradores. Conheça, abaixo, qual a posição do Tribunal sobre alguns dos principais assuntos relacionados a esses tipos de conflitos.

Uso exclusivo de áreas comuns

Dois moradores de um edifício no Rio de Janeiro recorreram ao STJ para anular a convenção de condomínio. Eles contestavam a autorização para uso exclusivo e individual de áreas comuns, no caso, pequenos depósitos construídos na garagem, alegando violação da Lei n. 4.591/64, a Lei dos Condomínios. De acordo com o processo, há um depósito para cada condômino e a distribuição foi feita por sorteio. Os depósitos são utilizados há mais de quinze anos, com aprovação dos demais moradores, com exceção dos recorrentes.

O STJ já tem consolidado o entendimento de que é possível a utilização, em caráter exclusivo, de partes comuns do condomínio, desde que aprovada em assembléia. Até porque o artigo 3º da Lei n. 4.591/64 determina que a convenção delibere sobre o modo de uso das partes comuns. (Resp 281290)

Furto em garagem

O condomínio só responde por furtos ocorridos nas suas áreas comuns se isso estiver expressamente previsto em convenção. Seguindo essa jurisprudência pacificada no STJ, a Quarta Turma acolheu recurso de um condomínio que havia sido condenado a indenizar um morador pelo furto de parte do aparelho som instalado em seu veículo, que estava estacionado na garagem do prédio. Para o STJ, não há fundamento jurídico para responsabilizar o condomínio quando ele não assumiu nenhuma obrigação quanto à guarda de veículos perante os condôminos.

Há um precedente que esclarece bem a situação. No julgamento do Resp 268669, foi decidido que a responsabilidade do condomínio por atos ilícitos contra os moradores ocorridos nas áreas comuns só pode ser reconhecida quando estiver expressamente prevista na convenção e claramente assumida. Isso porque a socialização do prejuízo sofrido por um dos condôminos onera a todos, e é preciso que todos, ou a maioria exigida, estejam conscientes dessa obrigação e a ela tenham aderido. (Resp 618533 e Resp 2688669).

Síndico faz uso particular de verba do condomínio

Não são raros os casos em que o síndico faz uso indevido do dinheiro do condomínio. A Sexta Turma julgou um habeas-corpus impetrado por um síndico condenado por apropriação indébita. Em duas ocasiões, ele usou dinheiro do condomínio para pagar despesas pessoais. Ele queria que a ação penal fosse parcialmente trancada, alegando que, em uma das situações, havia interesse do condomínio. Ele usou o dinheiro no pagamento de advogado para ajuizar uma ação privada contra uma moradora que o havia injuriado. Acrescentou que não sabia estar agindo de forma ilícita contratando esse serviço.

A Turma negou o habeas-corpus por considerar que a ofensa supostamente feita contra o síndico não ultrapassou sua própria pessoa. Além disso, o valor gasto com o advogado ultrapassou o equivalente a dez salários mínimos, quantia que precisava de prévia autorização do condomínio para ser gasta. De acordo com a sentença, o síndico tinha plena consciência dessa exigência (HC 105559).

Prestação de contas

O condômino, individualmente, pode pedir prestação de contas ao síndico quando ela não tiver sido feita por falta de convocação de assembléia e diante da impossibilidade de obtenção de quorum para realização de assembléia extraordinária. Em um recurso especial julgado pela Terceira Turma, o síndico contestou a legalidade desse pedido individual de prestação de contas. Alegou que a Lei n. 4.591/64 dá essa legitimidade ao condomínio, e não aos condôminos de forma direta e individualizada.

A Turma decidiu, por unanimidade, que a lei não atribui exclusividade à assembléia nem exclui literalmente a possibilidade de algum condômino pedir prestação de contas ao síndico, ainda mais com a peculiaridade do caso em que as contas não foram prestadas à assembléia. A decisão ressaltou que não é admitido ao condômino pedir a prestação de contas já aprovadas pela assembléia.

Acidentes e crimes no condomínio

O condomínio não é civilmente responsável por todos os fatos que ocorrem no seu interior. É o caso de atos dolosos praticados por terceiros. Essa tese foi aplicada no julgamento de um recurso especial em que a família de um homem assassinado pelo vigia do prédio pretendia responsabilizar o condomínio. Por unanimidade, a Quarta Turma entendeu que, mesmo estando a administração do condomínio a cargo do síndico, não se pode concluir que ele seja o responsável por todos os danos sofridos pelos condôminos, notadamente os causados por atos dolosos de terceiros.

Em outro caso, a Quarta Turma condenou um condomínio a indenizar e cobrir o tratamento médico de uma menina que, em 1998, quando tinha dez de idade, teve os cabelos sugados por um equipamento de limpeza enquanto nadava na piscina. Ela ficou em estado vegetativo em consequência do afogamento. Perícia comprou que o equipamento, uma bomba de sucção, era excessivamente potente para o tamanho da piscina, alerta que constava no manual, e que ele foi instalado sem acompanhamento técnico adequado. A mãe da vítima recorreu ao STJ para responsabilizar o condomínio. Os ministros atenderam esse pedido por considerar que, além do uso inadequado da bomba de sucção, o condomínio não instalou placas de alerta para o perigo nem impediu que a piscina fosse utilizada no momento em que a limpeza dela estava sendo realizada.(Resp 579121 e Resp 1081432).

Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça