O Shopping Center Morumbi e o Grupo Internacional Cinematográfico não terão de indenizar espectador que diz ter ficado traumatizado quando um estudante disparou tiros de metralhadora contra a plateia durante uma exibição do filme “Clube da Luta”, em 1999. A decisão foi da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recursos apresentados pelo shopping e pelo cinema.
No processo, o espectador narrou que estava numa sala de cinema do Shopping Center Morumbi quando o estudante começou a disparar a arma, matando três pessoas e ferindo gravemente outras quatro.
O autor da ação não foi atingido pelos tiros nem teve qualquer dano físico no episódio, mas alega que ficou psicologicamente traumatizado. Por isso, pediu indenização por parte do shopping e da empresa de cinema no valor de mil salários mínimos.
Em sua defesa, o cinema alegou ilegitimidade passiva, pois o shopping seria o responsável pela contratação e gestão dos serviços de segurança, devendo assumir integralmente as consequências do fato.
O shopping center sustentou que o recorrente não poderia ser considerado vítima efetiva do atentado, pois não sofreu nenhum ferimento. Também alegou que o incidente foi um evento imprevisível.
Dever de vigilância
Na sentença, o juiz condenou o shopping e o cinema ao pagamento da indenização por danos morais no valor de cem salários mínimos. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou a sentença, pois reconheceu a responsabilidade civil do cinema e do shopping com base na teoria do risco do empreendimento e no descumprimento do dever de vigilância.
Inconformados, o shopping e o cinema apresentaram recursos no STJ. Afirmaram que o autor da ação não sofreu qualquer lesão e que a teoria do risco do empreendimento não poderia ser aplicada, pois não é objetivo de nenhuma das empresas a garantia da “incolumidade física dos clientes e frequentadores do estabelecimento”. Argumentaram ainda que a responsabilidade objetiva deveria ser afastada tendo em vista o fato de terceiro.
Risco do negócio
De acordo com o ministro Marco Buzzi, relator dos recursos, a responsabilidade civil do shopping e do cinema é objetiva e está fundada na teoria do risco do empreendimento, adotada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), aplicável ao caso em virtude da relação de consumo existente entre o autor da ação e o cinema, bem como entre ele e o shopping center.
O ministro explicou que essa teoria impõe que todo aquele que se propõe a exercer alguma atividade no mercado deve responder pelos eventuais defeitos ou vícios dela decorrentes ou a ela inerentes, independentemente de culpa.
Entretanto, segundo Buzzi, no âmbito da responsabilidade objetiva admitem-se as excludentes de causalidade. O fato de terceiro é uma delas, pois afasta a responsabilidade do fornecedor de serviços.
Evento inevitável
Nesse caso, o fato de terceiro foi caracterizado pelos disparos de arma de fogo feitos pelo estudante no interior da sala de projeção, “consubstanciando evento imprevisível, inevitável e autônomo”, apto a romper o vínculo existente entre o dano alegado e a conduta do shopping e do cinema, declarou o relator.
O ministro afirmou que não seria razoável “exigir das equipes de segurança de um cinema ou de uma administradora de shopping centers que previssem, evitassem ou estivessem antecipadamente preparadas para conter os danos resultantes de uma investida homicida promovida por terceiro usuário”.
Buzzi avaliou que, se o shopping e o cinema não concorreram para que o evento danoso acontecesse, “não há que se lhes imputar qualquer responsabilidade, sendo certo que esta deve ser atribuída com exclusividade a quem praticou a conduta danosa, ensejando assim o reconhecimento do fato de terceiro, excludente do nexo de causalidade e, em consequência, do dever de indenizar”.
Com esses fundamentos, a Quarta Turma julgou improcedente o pedido feito pelo espectador na ação de indenização.