Atividades do Nupre põem em evidência deslizes mais comuns de advogados

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Há pelo menos duas maneiras de comemorar o sucesso do Núcleo de Procedimentos Especiais da Presidência (Nupre), unidade que funciona como um “filtro” para processos manifestamente incabíveis ou sem perspectiva de provimento: Uma, óbvia, é a agilidade na prestação jurisdicional para o cidadão e a economia de trabalho e de tempo para advogados e funcionários. Outra, nem tanto, é o fato de que a atividade do Nupre acaba servindo de alerta para deslizes “primários” cometidos por advogados na interposição de agravos, recursos e outros, que podem colocar fim à esperança de cidadãos no sucesso das ações.

No primeiro caso, funcionários do Nupre identificam os agravos de instrumento e recursos especiais referentes a temas com jurisprudência consolidada no Tribunal, cabendo ao presidente decidi-los, evitando que questões sobre as quais não há “nada mais a dizer” sejam distribuídas aos demais ministros. Um exemplo foi a decisão tomada em recurso especial da Brasil Telecom, interposto em abril de 2008.

Competente para julgar o caso, a Segunda Seção decidiu que o valor patrimonial das ações definido no balancete do mês da integralização é o parâmetro correto para calcular a quantidade de ações da companhia que deveriam ter sido subscritas ao adquirente de linha telefônica. Apesar disso, a Brasil Telecom queria rediscutir. Em decisão unipessoal, o presidente deu provimento apenas para reafirmar o definido pela Seção, evitando a redistribuição, novo relatório, entrada em pauta e julgamento.

De outro lado, estão os agravos manifestamente descabidos ou sem perspectiva de provimento, como recursos interpostos por advogados sem procuração nos autos, os intempestivos (fora do prazo) e os que não contêm peças obrigatórias, entre outros critérios. De abril de 2008, quando foi criado o Nupre pelo então presidente Humberto Gomes de Barros, até janeiro de 2009, quase 14 mil agravos tiveram o provimento negado ou não foram conhecidos por problemas desse tipo. Em favor da agilidade na resposta judicial, mais de 20 mil processos deixaram de abarrotar os gabinetes.

O Nupre, na prática, é uma extensão do Núcleo de Agravos da Presidência (Napre), incluído no planejamento estratégico da gestão do presidente Rafael de Barros Monteiro, em 2007. Uma resolução assinada na ocasião permitia ao presidente negar seguimento aos agravos de instrumento descabidos ou sem chance de provimento. O Nupre ampliou o alcance, passando a identificar os recursos que pretendem rediscutir questões já pacificadas no tribunal.

“A Corte Especial, que antes era responsável pelo processamento desses autos, agora pode focar seus esforços nas causas de procedimentos mais complexos, que é a real atribuição dela”, ressaltou, na ocasião, o assessor-chefe do Nupre, Rubens Cesar Rios. Ferramenta eficaz na agilização dos procedimentos judiciais, o Nupre acaba, também, por evidenciar, os erros, ou “vacilos”, mais comuns cometidos pelos defensores das partes.

Direito e Justiça

Quando um cidadão entra na Justiça, é porque acredita que algum direito seu lhe foi negado de algum modo. Então, confiante que a Justiça será feita, arranja advogado e se prepara para a luta, sabendo que pode ganhar ou perder. Sendo a jurisprudência reinante no meio jurídico a favor de seu pretenso direito, o que acontece se o advogado perde o prazo, ou deixa de apresentar o documento certo?

“Em regra não se pode pleitear indenização do advogado por não haver obtido êxito na pretensão, pois tal não é o dever do profissional liberal, que tem, isso sim, dever de diligência e perícia”, afirma Alex Sandro Ribeiro, advogado e consultor especializado em microempresas e empresas de pequeno porte, em seu trabalho sobre a responsabilidade civil do advogado e o código de defesa do consumidor.

Apesar de não ser justo, é claro, imputar ao advogado a responsabilidade pelo resultado de um processo judicial, como ficam “os deveres de diligência e perícia” nos casos em que o advogado se esquece de comprovar o pagamento das custas judiciais, por exemplo, e o presidente do STJ nega seguimento ao recurso, mesmo que a questão de fundo, o direito pretendido pelo consumidor, tenha jurisprudência em seu favor?

“Os embargantes não comprovaram o recolhimento das custas judiciais no ato da interposição dos embargos de divergência (artigos 511, caput, do CPC, 9º da Lei n. 11.636/2007 e 1º, parágrafo 1º, da Resolução n. 01/2008-STJ)”, diz o presidente em um dos 212 despachos do Nupre.“ Intime-se o impetrante para que providencie e comprove o recolhimento das custas judiciais, no prazo de dez dias, sob pena de extinção do processo”, determina em outro.

A falta de comprovação do pagamento das custas judiciais é a campeã das publicações no Diário de Justiça Eletrônico do dia 9/2/2009. Casos em que o embargante tem direito à Justiça gratuita também devem ser comprovados por meio de documentos, geralmente esquecidos. Outro problema comum é a ausência de procuração outorgada ao advogado, o que impede ao presidente o conhecimento do agravo.

Outra questão corriqueira é agravo dirigido ao STJ, quando deveria ter sido direcionado ao tribunal de origem. Qual a decisão? “No caso em exame, o apelo nobre desafia a decisão monocrática de fls. 351-352, contra a qual caberia o agravo na origem, nos termos do parágrafo 1º do artigo 557 do CPC. Assim, não tendo sido exaurida a instância ordinária, incabível o recurso especial. Diante disso, nego provimento ao agravo”, diz, muitas e muitas vezes, o presidente nos despachos exarados pelo Nupre.

Na falta de uma certidão de intimação, ou cópia da íntegra do acórdão recorrido, ou ainda, falta das contrarrazões ao recurso inadmitido, enfim, na ausência de peças obrigatórias que caberia ao advogado contratado providenciar, o que pode levar o autor a perder a ação e frustrar a sua expectativa de direito, nos casos de jurisprudência consolidada em favor de sua pretensão, por exemplo, quem responde pelos prejuízos numa eventual ação de responsabilidade civil pela perda de uma chance?

Em obra sobre o assunto, o jurista Arnoldo Wald observa que os artigos 1.545 e 1.546 do Código Civil tratam, especialmente, da responsabilidade dos médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentistas, esclarecendo que são obrigados a indenizar os danos provenientes de sua imprudência, negligência ou falta de técnica. “Trata-se de aplicação de um princípio geral que se aplica a todos os profissionais, inclusive advogados, arquitetos e engenheiros”, ressalta.

Há pelo menos duas maneiras de comemorar o sucesso do Nupre: uma é como ferramenta eficaz na agilidade da prestação jurisdicional, interesse de todas as partes. A outra é a grande capacidade que certamente têm os seres humanos, e certamente a nobre classe dos advogados, de transformar eventuais “pedras de tropeço” em aprendizado para uma vida toda de ações e “ações”.

Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça